sábado, 5 de janeiro de 2008

Gato Burro Abrasado

O guarda Borrabotas estava sendo baleado outra vez enquanto, a vinte quilômetros dali, José Pereira Silva dos Santos preparava uma mamadeira para seu filho, Saulo Silveira Silva dos Santos. E a vinte quilômetros de José Pereira Silva dos Santos o capitão dizia "Puta merda, o Borrabotas caiu de novo! Alguém traz um pano e limpa a farda dele antes que o sangue seque. Eu quero outro homem nela ainda hoje!".

Era uma refinaria de petróleo sendo assaltada. Os assaltantes entraram, renderam os trabalhadores, trancaram as portas e selaram com piche. E não conseguiram reabrir. Passaram uma semana sem maiores problemas, fazendo castelinhos de asfato e apostando corridas de betoneiras contra os reféns. Tinham parafina estocada para saraus à luz de velas e vaselina para o que acontecesse depois. Estava muito muito bom, tudo muito bem, mas logo eles encontraram um problema: petróleo não é exatamente recomendado para consumo humano direto. Então começaram a pedir pizza. Calcularam que teriam dinheiro suficiente para ficar um mês nessa situação mantendo todo mundo vivo à base de redondas. Calcularam errado, porque as pizzas tinham que ser arremessadas por cima do muro e nenhum deles era especialmente experiente em frisbee. Isso se traduziu em um aproveitamento alimetício baixo e, em seis dias, resolveram avisar a polícia do roubo para que pudessem negociar e fazer demandas. Estavam exigindo, majoritariamente, napolitana e peperoni.

Como ninguém podia entrar ou sair por causa do piche, o capitão não sabia o que fazer. E estaria perdido para sempre, não fosse o cavaleiro galopante que chegava à cena e se dirigia a ele:

-Céus, general, seu exército deveria trazer catapultas para invadir castelos.

-Homem-Táfora, graças a deus! Estávamos ficando desesperados. Já sabe da situação?

-Vejo formigas cobiçando um torrão de açúcar cercado por fogo.

-Hã... mais ou menos. O açúcar quer pizzas e não vai entregar os reféns, até por impossibilidade.

-Ora, general-formigão, o açúcar logo virará caramelo caso o senhor não desligue o fogão.

-Sim, mas ele não tem água, Homem-Táfora. E se nós usarmos a nossa, eles executam os reféns. E não queremos que os reféns virem caramelo.

-O caramelo irá começar se espalhar, apagando o fogo ao redor, fique tranqüilo.

-Quer dizer que eles vão sair quando ficarem desesperados? Tudo bem, mas sabe-se lá o que eles vão fazer com os reféns.

-Hum... é verdade que, quando o caramelo secasse, deixaria uma mancha bastante desagradável no fogão.

-Mancha? Os reféns mortos? Eu me perdi, Homem-Táfora.

-É claro que vocês seriam as formigas, então não ligariam para uma mancha no fogão. Vocês teriam que ser donas-de-casa.

-Hein?

-O que elas cobiçam que poderia estar cercado por fogo? Espera aí. Elas não temem fogo tanto assim. Poderiam usar extintores.

-Homem-Táfora?

-Vejo donas-de-casa cobiçando um pênis cercado pelo resto do homem, general. Não, espera... não está bem certo ainda.

-Porra, Homem-Táfora, você vai entrar ou não?

-Eu não entro, general dona Maria. Por isso minha montaria me deu esse nome ridículo.

-Sua montaria?

-O Potro Cadilho. Desnecessário dizer que ele mesmo se nomeou.

-Seu cavalo fala?

-Espera aí... Dá pra fazer funcionar...

-Seu cavalo fala e você perdeu pra ele uma discussão sobre o seu próprio nome? Quão idiota é você?

-Vejo formigas mesmo, general. E se não conseguem pegar o açúcar, tragam as abelhas, o mel delas lhes trará grande satisfação.

-Abelhas? Um helicóptero? Você acha que eu já não pensei nisso? O helicóptero está ocupado. E você não está sendo de muita ajuda, cacete.

Mas o Homem-Táfora já tinha pego o alto-falante e estava bradando a plenos pulmões:

-Açúcares, rendam-se ou serão picados por abelhas tão logo estiverem virando caramelo!

-Homem-Táfora, eles não entendem o que você diz. E sabe o porquê? Porque eles não são loucos! - insistia o capitão, já um tanto quanto revoltado.

-Certo. Não molhe o fogo, molhe o açúcar.

-Eu nem vou fingir que tenho idéia do que você está falando agora, já deu no saco.

-Jogue água no açúcar, capitão, e ele não virará caramelo. Mas ficará pegajoso o suficiente para grudar nos seus dedos.

-Dedos? Eu sou a porra de uma formiga, seu corno do caralho! Eu não tenho dedos!

-Não, general. Eles são as formigas. E lá dentro já conseguiram o açúcar. Você precisa de um tamanduá! Um tamanduá que cuspa muito!

-Alguém tire esse cara daqui!

E começaram a carregar Homem-Táfora para longe.

-Mas general, você já tem o tamanduá! Cuspindo pelo seu bico longo e fino! Está logo ali!

-Cala a boca ou eu mando te meterem uns pipocos.

Nunca souberam que ele se referia a um caminhão dos bombeiros. Nem que realmente daria certo distraí-los com pizzas e derrubá-los com jatos d'água. O que aconteceu foi que todos os reféns, assaltantes e policiais morreram, porque a refinaria foi invadida à base de bombas e acabou explodindo quando saiu um tiroteio perto dos tanques de gás. Dos relatados no incidente somente Homem-Táfora, Potro Cadilho e Borrabotas viveram para contar a história. Mas não contam.

2 comentários:

Unknown disse...

hahahaha! Muito bom! Gostei bastante desse!!

Mono disse...

Muito bom. VOcê transformou a aula do Mitsuru em algo útil. Vamos escrever um livro sobre o homem-táfora e o Sir Casmo?