segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Teu Aroma Gaseado

Os dois homens pararam por um segundo. Cada um deles olhou bem profundamente nos olhos do outro.

-Ah, é?

-É.

-Pois sua mãe é tão gorda, mas tão gorda...

-Por favor, sr. presidente... - tentou interromper o ministro da fazenda.

-...que quando mostrou a bunda pro seu pai, ele virou um lobisomem!

-Ok, senhor, minha mãe é gorda - prosseguiu o assessor de imprensa, mais desapontado que bravo - mas anunciar isso não refresca em nada a nossa situação.

-Tá, tá, eu preciso pensar.

-Infelizmente, como eu expliquei, não temos esse luxo. Precisamos soltar uma nota agora ou estaremos em maus lençóis não só com o eleitorado mas também internacionalmente.

-Ora, consiga-me mais tempo!

-Já enrolei o quanto podia, senhor. Precisamos de uma nota oficial agora.

-Ah, é? Pois sua mãe é tão gorda, mas tão gorda, que a NASA usou a pança dela pra forjar o pouso na lua!

-Senhor, por favor, eu lhe peço - se intrometeu o ministro de relações internacionais - que encontre outra forma de lidar com a frustração, diferente de ressaltar o índice adiposo de progenitoras alheias comparando-as à lua.

-Tá, tá, eu preciso pensar.

Deu-se uma breve pausa em que todos da sala tomaram um pesaroso gole de café.

-Podemos dizer que foi um acidente e que nós não temos nada a ver com isso.

-Com todo o respeito, senhor, se isso fosse remotamente viável, não estaríamos nessa reunião. Na verdade, é a solução que eu esperaria de uma criança de quatro anos de idade que quebrou o abajur da sala.

-Tem razão. Então prepare um jipe para mim.

-Um jipe, senhor? Por quê?

-Porque sua mãe é tão gorda, mas tão gorda, que eu quero usar as celulites dela como dunas.

Em um canto discreto, o secretário geral de afazeres do gabinete central cochichava para o encanador:

-Acredita que esse cara teve mais de setenta milhões de votos?

-Infelizmente, doutor. Tendo em mente a decadência inteleco-moral que se apresenta reversamente proporcional ao número de indivíduos que compõem a amostragem, a democracia é um conceito, digamos, de eficácia duvidosa. Sua implementação na forma de presidencialismo é também muito interessante por ser altamente contraditória. Partindo do pressuposto acertado de que o povo é demasiado incompetente para o governo, dá-se a essa massa estúpida confessa a incumbência de selecionar aquele que irá administrá-los. Supõe-se que seja alguém mais capaz e inteligente que o coletivo e que, portanto, vá tomar decisões diferentes das que seriam as abraçadas pela população. Então o que se faz, trocando em miúdos, é captar um representante que tem o dever de não representar, e deixá-lo entre a cruz e a espada: se fizer o que o povo deseja, terá como resultado um trabalho porco e será crucificado; se fizer um bom trabalho, irá de encontro a seus sustentáculos políticos e perderá o emprego. Então só resta a opção de comprometer o trabalho agindo como uma prostituta popular e mentir para os que o elegeram sobre a maioria das boas manobras que conseguir bolar. Como se o técnico de um time de futebol fosse compelido a manter os jogadores alheios às táticas necessárias ou, até, à intenção de marcar o gol.

-Ah, você viu o jogo do Mengão ontem? Baita gol do Ricerinho, hein?

-Golaço.

Voltando ao debate principal, as coisas estavam esquentadas por causa de uma idéia ousada do chefe do programa espacial. Idéia essa tão ousada que mereceria duas ressalvas do tipo mãe/lua seguidas por parte do presidente, não fosse ele o maior defensor da proposta.

-Inadmissível! Milhares de carcaças?

-A gente explica numa coletiva: "Fodam-se os golfinhos! Estamos no meio de uma crise e devemos fazer o que for necessário." Ou será que eu preciso falar da mãe de mais alguém daqui?

-O problema é que golfinhos são extremamente populares. Despejar dois mil corpos de golfinhos certamente resolveria o problema, mas acabaria sendo um desastre de relações públicas ainda maior! E, em uma nota adicional, eu também não recomendaria o uso da frase "fodam-se os golfinhos" em entrevistas.

-Droga. E se usarmos algum outro animal, como cachorros?

-As pessoas gostam de animais em geral, senhor, e o povo é muito sensível. Quaisquer milhares de carcacinhas e já vamos ter uma porrada de ativistas e ecochatos a reclamar.

-E se...

-Pessoas também são animais, senhor, e pessoas gostam de pessoas, ou pelo menos tentam se convencer disso, se essa seria a próxima sugestão do senhor. -acrescentou o assessor de relações públicas.

-Sua mãe é tão gorda... - começou a retrucar o presidente.

-Meu dentista me disse que existem doze problemas bucais... - falhou em fazer-se audível a TV.

A balbúrdia só se resolveu quando o bobo se fez valer e sultilmente retirou da conversa os elementos menos colaborativos, maravilhando-os com um hábil truque que causava a impressão de ele separar e depois unir novamente duas metades de seu polegar. Batalha vencida, guerra perdida, pois o resultado foi, surpreendentemente, uma revolução popular que depôs o governo e dizimou os golfinhos. E, dando ainda mais créditos visionários ao então ex-presidente, "fodam-se os golfinhos" virou o slogan do seu sucessor eleito, proponente de um claro e óbvio plano reprodutivo para a espécie.

2 comentários:

Bakunin, o mochileiro comilão de Browniânia disse...

Cara, vc só vai conseguir ser alguém na vida e ganhar algum dinheiro, depois que eu concluir a faculdade de cinema e te chamar para usar seus textos. Aí a gente ganha o Oscar para o Brasil e todos vão dizer, sobre sua biografia: "Caramba, até os 55 anos idade esse cara era ninguém e tampouco tinha algum dinheiro; mas olha só, perseverança é a alma do negócio".

Vinhote Que Rusga disse...

Eu acho que vou ter que esperar bastante, então. Cinema vai ser sua sexta ou sétima faculdade?