terça-feira, 4 de novembro de 2008

Supreme Homo

Certa vez me disseram que o Super-Homem é o maior vilão de todos os tempos. Dos quadrinhos, pelo menos, senão ele teria que competir com Palpatine, Cthulhu, Cheney e vários outros contra os quais não teria a menor chance. O racioncínio por trás dessa afirmação é bem simples: em vários cross-overs, o Super-Homem já enfrentou uma gama muito maior de heróis que qualquer Coringa, Thanos ou Massacre. Até porque enquanto esses vilões clássicos geralmente enfrentam grupos que garantam um bom quebra, o Super-Homem não se importa nem um pouco com isso e já enfrentou, por exemplo:

Hulk – Você até poderia dizer que o Hulk teria alguma chance, porque ele é ridiculamente forte. Mas enquanto o Hulk arremessa tanques de guerra e racha ilhas ao meio, o Super-Homem arremessa continentes. E isso na última versão, mais fraquinha, porque ele já chegou a jogar sinuca com planetas na era de ouro. Além de ser muito mais forte, ainda ultrapassa a velocidade do som e tem visão de raios-x, de calor, sopro congelante e diversos outros poderes de frutinha que não fariam muita diferença mas contam como uma espécie de bônus por variedade.

Homem-Aranha – Sério... sacanagem. Não só o Homem-Aranha não tem a mínima chance de machucar o Super-Homem como a versão cinematográfica dele é muito mais afetada e baitola que a do azulão. O único caso em que pode haver uma vitória do Aranha aqui é se estivermos falando do Aranha japonês contra o Super indiano. Porque o robô Leopardon arrebentaria com a cara daquele Kumar. Em se tratando de versões clássicas, tenha dó.

Batman – Um ser semi-onipotente de superpoderes messiânicos contra o filho bastardo que um ninja zoófilo teve com o inspetor bugiganga? Claaaaro, por que não? Além de ser uma premissa babaca, pra piorar as coisas sempre que acontece uma dessas o Batman acaba ganhando. Ou porque ele sempre tem um estoque de kriptonita à mão ou porque ele usa bombas atômicas e trajes robóticos. De qualquer jeito, é uma vitória muito mentirosa!

Muhammed Ali – Bom... ele derrubou o George Foreman, o Joe Frasier... mas eu ainda acho que o Super-Homem teria vantagem. Acho que acho errado, porque Cassius também ganha, e sem nenhuma ajuda – derruba o homem de aço num gancho de direita. E depois perde uma simulação pro Rocky Marciano, que deve ser o humano mais forte do universo.

Enfim, o Super-Homem realmente enfrentou todos esses oponentes. Roubalheiras à parte, nenhum à altura dele, porque afinal ele é absurdamente forte, absurdamente rápido e absurdamente voôso. Mas eu encontrei um páreo para ele que não precisa recorrer a essas palhaçadas de pedrinhas coloridas. Então sem mais delongas, aqui vai a minha breve versão de Super-Homem contra as leis da física:

Uma bala A viajava a cerca de 430m/s quando encontrou um corpo B, de Borrabotas, que continha uma bala C de alvejadas anteriores. Como acontece num jogo de bilhar, a bala A tranferiu sua inércia à bala C, ejetando-a, e alojou-se dentro de B. Ou, na realidade, dentro de B menos uma certa porcentagem de B equivalente ao buraco causado por A e C. Calcule o provável cenário dessa cena adotando como personagens uma casa lotérica, alguns policiais, um sargento, reféns, um Super-Homem e um punhado de bandidos.

- Cacete! É o Super-Homem! Até que enfim eu não vou mais ter que aturar heróis de meia-tigela! - soltou o sargento.

- Sim, senhor. Eu sou o Super-Homem. Em que posso ajudá-lo nesta fantástica manhã em que o sol brilha iluminando o sonho americano?

- Bom, Super-Homem, uns cabeças-de-Vivarina, reféns, uma casa lotérica. Mesma merda de sempre. Dá pra resolver?

- Ora... será um prazer, louvado seja Allah.

E para que realmente sua atividade de busca e apreensão de malfeitores fosse como ele descreveu, Super-Homem resolveu usar sua super-velocidade para retirar todas as armas e os reféns das mãos dos meliantes e deixá-los desarmados e apreensivos dentro de um cubículo, o que seria engraçado. E pôs-se a correr hipervelozmente em direção à lotérica, tocando em cerca de um quarto de segundo o chão com seu nariz. O que acontece é que ele aprendeu que não importa o quão fortes e rápidas sejam as suas pernas, se você as movimentar muito velozmente tentando dar um impulso, vai superar a resultante da força normal com a do coeficiente de atrito de sua bota de pano com o gramado, fazendo você escorregar com assombrosa rapidez. Percebendo isso, Super-Homem tentou aumentar sua força normal fazendo uma redistribuição vetorial do seu impulso. Isso teve duas conseqüências bastante óbvias: um enorme buraco no gramado e um homem de capa sendo lançado balisticamente por uma distância irrisória.

O sargento, testemunhando esses eventos, já previu mais um fracasso e pensou em pedir o telefone de outros heróis mais habituados ao mundo real, como o Homem-Lógico ou o Anagraman. Enquanto isso, Super-Homem bolava um modo de chegar à casa lotérica. Correr estava fora de questão, mas ele poderia voar! Seu vôo nunca foi exatamente um fenômeno físico.A propulsão vinha aparentemente do nada e o impulsionava como mágica. Apesar das teorias que dizem ser o vôo do Super-Homem uma manifestação do tubo digestivo dele usado como turbina, numa espécie de versão escatológica do super-sopro, o vôo do homem de aço era um poder muito limpo em termos de efeitos colaterais. Então pôs-se a voar em super velocidade até a porta da lotérica. E em cerca de um quarto de segundo, de novo, que parece ser o tempo de reflexo do homem de aço, ele de viu em outra parte da cidade, tendo deixado uma linha reta de caos e destruição.

O que acontece é que o Super-Homem não tem muitos poderes sobre o tempo, além de girar a Terra ao contrário. E nem tem um cérebro super acelerado. Se tivesse, poderia parar com essa palhaçada de combate ao crime e ser um matemático brilhante. Ou melhor: um físico, já que tinha acesso às estrelas diretamente e um telescópio embutido no olho. E quando você se move a cerca de 3.000m/s seu cérebro não consegue nem interpretar o que está acontecendo. Você não consegue reagir a nenhum obstáculo, até porque não o está vendo – é tudo um grande borrão. Então Super-homem voou lentamente de volta até a lotérica, volta e meia caindo ou batendo em um poste por estar com um caso de superlabirintite.

Quinze minutos depois lá estava ele, de volta à cena do crime, já enfezado. Resolveu que ia deixar o show de lado e ser curto e grosso, objetivo e eficiente. Foi entrando porta adentro e tomando uma saraivada de balas que ricocheteavam e atingiam civis inocentes - de tudo menos da curiosidade - que espiavam fora da área de isolamento. Uma vez cara a cara com o primeiro crminoso, socou-o, deixando-o com o pulmão perfurado por meia costela. Nessa hora um dos bandidos resolveu atirar em um refém. Super-Homem, como estava próximo e previu o tiro e sua trajetória, pôde usar somente seu braço para ser hiperveloz. Isso é bom, porque ele pode contrabalançar o movimento do braço com seu poder de vôo. Foi possível colocar o braço no caminho da bala tão logo ela foi lançada, salvando um homem voador, surdo e severamente queimado de ser baleado. Lógico que o homem não estaria surdo ou com sérias queimaduras se um braço não tivesse alcançado Mach 8 a um palmo de seu nariz, sendo tão destruidor quanto um meteoro a esse ponto, rompendo seus tímpanos com o rompimento da barreira de som e deslocando tanto ar quanto um tufão.

Todos na lotérica severamente feridos por esse ato impensado, Super-Homem tinha resolvido o problema, embora não de uma forma exatamente eficiente. Envergonhado, resolveu passar o resto de seus dias tricotando. Lentamente. Fim.

Ou não, porque não se sabe se ele é imune a radicais livres, caso em que talvez não houvesse um final, mas uma segunda história, sobre o maior suéter do mundo.

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