Por volta de 1995, eu tinha acesso a conexão discada e, volta e meia, ganhava alguns CDs que me davam direito a três horas grátis de acesso pelo UOL. Eventualmente, impressionado com essas demonstrações e ansioso por mais, cheguei a obrigar mamãe a assinar um plano de dez horas mensais. Pulsos telefônicos pagos à parte. Para comparação, o plano custava R$29,90, e isso numa época em que a promoção do McDonald's custava R$4,90. De acordo com meu índice altamente científico de normalização por Big Mac, hoje o custo desse plano seria de R$109,23. Dez horas mensais, 33.6kpbs, pulsos telefônicos à parte e linha ocupada durante a utilização. Eu me sinto ancião. E você deve se sentir também.
De qualquer forma, a internet era altamente impressionante, muito embora não houvesse muita coisa a ser feita nela. Eu só me lembro de duas opções: mIRC ou chat do UOL. Esse último era particularmente divertido porque envolvia o conceito de anonimidade, tão maravilhoso e cobiçado por pentelhos de dez anos de idade. De repente, você podia dizer qualquer coisa que quisesse, por mais ofensiva que fosse. Podia se passar por qualquer pessoa, ser um camaleão. Enganar pessoas, ciar e destruir esperanças. Falar de putarias grosseiras. E o melhor: fazer isso tudo sem nenhuma conseqüência punitiva. Aliás, sem nenhuma conseqüência, porque não havia inocentes no chat do UOL. Todo usuário, independentemente de ter como apelido gatinho25, PAU_ERETO, fogozinha14, Gozo_do_Bozo, madura55F ou qualquer outro, era um moleque de dez anos querendo esculhambar. Ou seja: uma diversão sem vítimas.
Mas hoje a coisa é diferente. O Facebook é uma pataforma fantástica para chocar pessoas anonimamente, porque todo mundo está lá. Muito embora esse esfoço não se faça necessário por conta de o lugar já estar superopovoado de gente aparentemente empenhada em ser perturbadora e desagradável (seja proposital e anonimamente ou não). Da mesma forma, a ânsia natural de um moleque por depravação e putaria pode ser muito melhor atendida por um dos N sites de vídeos disponíveis na rede. Para enganação, mentira, perfídia, criação de vínculos afetivos falsos a serem cruelmente destroçados, o MSN é um veículo muito melhor por ser mais duradouro. Então o que resta, para um pentelho de dez anos, no chat do UOL? Nada, aparentemente. Existem veículos melhores para todas as atividades que eram lá conduzidas por eles (ou nós, no caso). E ficou a dúvida: o que restaria, então, dos chats do UOL? Ainda existem? Agora são sérios? Existe gente lá tentando ter conversas divertidas ou significativas?
Ei, ainda existem! Que coisa. Francamente, eu esperava que fosse uma relíquia comunicacional, algo extinto por novas e mais específicas tecnologias, como Orkuts e Chatroulettes. Então vamos dar uma olhada aqui no que as pessoas estão dizendo. Como não quero que essa primeira seleção filtre o conteúdo de nenhuma forma, porque quero investigar o âmago do chat do UOL em si, resolvo checar a sala "Tema Livre". Escolho o apelido "Fred" porque o ambiente deve estar civilizado demais para "pauduro_pontagrossa". Sinto-me ansioso. O que será que me espera nessa sala?
Ah. A mesma merda de dezessete anos atrás. Clique para ampliar, se esse peso de alguma esperança na nova geração que você carrega estiver te incomodando. Bom... eu digo "nova geração" e estou insistindo que são crianças tirando sarro porque a alternativa é muito mais sombria. Podem ser adultos sendo sinceros. Pare e considere o quão assustador esse quadro é, antes de continuar seguindo meus passos. Seja como for, talvez "tema livre" seja só pra quem não tem foco nem objetivo pelo chat do UOL, o que resulta em putaria porque... bom, porque tudo que é necessário para a soberania da putaria é a presença de pessoas sem outro assunto se fazendo óbvio. Então decidi visitar a sala mais cerebral do chat: literatura brasileira. Eu esperava encontrar alguém tentando falar sobre Quincas Borba e sua relação com o neoconsumerismo em meio a pivetes xingando todo mundo.
E foi mais ou menos o que eu encontrei. Exceto pelo cara falando sobre Quincas Borba e neoconsumerismo. Vai ver o filtro não foi certo. Talvez eu tenha outros modos de selecionar pessoas. Partindo do princípio de que a pivetada que freqüenta esse chat é de classe socioeconomica baixa, de pouca idade e provavelmente não muito empenhada nos estudos, é possível que eu tenha mais sorte numa sala que se propõe a ter diálogos em inglês. Mesmo sendo um idioma carne de vaca hoje em dia, pelo menos para manter longe aqueles que não têm alguma proficiência nele, deve servir como filtro rudimentar, não?
Tá. Não, aparentemente. Sabe... a essa altura, eu estou ficando incomodado com mulheres usando apelidos em rosa. Isso claramente indica que ela tem uns treze anos e muitas Barbies ou que tem uns dez anos e pinto. Então vamos tentar algo diferente. Vamos especificar aidade. Vamos ver o que achamos "de 20 a 30 anos".
Spam. E de dois jeitos diferentes: um bot, aparentemente, e um nego que soa desesperado. Aparentemente um espírito irmão, também decepcionado por encontrar só crianças. Pensando bem, eu deveria ter puxado papo com ele, mas fui muito estartréquico na minha política não-intervencionista. A única diferença entre nós, afinal, é que eu estava num experimento sociológico e ele, aparentemente, numa busca por amor e sexo. Não pude deixar de pensar que, no lugar dele, eu teria tomado atitudes bem diferentes da que presenciei. Prosseguindo: e por localização geográfica? O que eu poderia encontrar?
Aqui meu mundo ruiu. "carinhoso..!" deixa bem claro, com sua foto, que não são só crianças aqui. Tem gente grande tão estúpida assim. Eu sei, eu sei. Claro que eu já sabia disso. Como eu mesmo citei, o Facebook cumpre bem esse propósito de retirada da fé na humanidade, mas toda vez que encontro indivíduos desse calibre, me surpreendo. Ou, melhor dizendo, me amedronto. E continuo impressionado por uma métrica: não importa para que sala você vá, os nomes continuam curiosamente homogêneos. Repare, sim? Enquanto isso, eu vou preparando a próxima sala dos horrores. E vai ser Namoro Virtual. Afinal, se toda sala tem se comportado como se seu tema fosse sexo ou namoro virtual, o que eu poderia esperar de uma que tivesse esses temas expressos? A mesma coisa?
Uau. Errado de novo. Os apelidos continuam os mesmos, mas aqui existe uma diferença sutil: geralmente são os homens dizendo porcarias e chamando mulheres para conversa em chat aberto, mas aqui nós temos as mulheres iniciando conversas. Isso é uma mudança que gera reflexões quase infinitas. Seria este canal o único realmente sério e verdadeiro, onde mulheres desesperadas (provavelmente feias e/ou gordas) vêm para agarrar qualquer homem que queira bater um papo? Serão essas meninas mais pivetes? E, se o comportamento aqui é tão diferente, elas sendo pivetes, será que as outras também são? Muitas possibilidades, mas claramente nenhuma delas é de aquecer o coração. Agora, vamos à sala de sexo virtual?
Decepcionante. Nenhuma cyberorgia. A única pessoa dizendo baixarias é obviamente um bot mal escrito que acha que um "cuzinho" pode ser "rosadinha". No geral, uma sala relativamente pudica. Só um usuário com apelido do nível de "MOSTRANDOOPAUNACAM", por exemplo, menos que Tema Livre e Literatura Brasileira. Esse mundo é um poço de ironias. Estou muito desgostoso e, para fechar, vou passar pelo canal de 70 anos ou mais. Antigamente era ótimo, juntava verborragia putárica pré-adolescente comum com excrescências atribuíveis aos septuagenários. Acidentes envolvendo boquetes e Corega, por exemplo. Então espero, pelo menos, achar algo que me faça rir.
Mas, para minha mais nova surpresa, eu encontro verdade no chat do UOL. Esses são obviamente septuagenários. Vejam como só entram e saem de salas, a esmo, sem dizer uma palavra. Provavelmente nem se lembrem do que foram fazer por lá quando finalmente chegam. O Alzheimer se revela novamente nos apelidos: gente como "MINEIRA 50 ANOS" e "MARCOS 49" já nem se lembram da própria idade e devem achar que ainda estamos na década de 70.
Tudo isso foi um experimento... instrutivo. E eu adoraria tecer umas configurações finais, mas depois de olhar de novo, com atenção, os registros dessa empreitada, eu preciso de uma bebida. Urgentemente.
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Um comentário:
Que preconceituoso com as pessoas que têm muitas Barbies!! Vou contar pra minha mãe
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