Etiqueta à mesa - um certo problema para mim. Na verdade, tirando uns raros dias de humor esquisito, eu considero etiqueta, na sua essência, um pé no saco. Mas à mesa fica tudo um pouco mais exacerbado, por algum motivo. Se você não segue algumas regrinhas malucas, as pessoas podem te olhar torto.
Um bom exemplo, a meu ver, é o guardanapo no colo. Não importa quantas vezes eu pense nisso, me parece algo bem imbecil. Se você precisa do guardanapo, é porque está babando comida, o que, se não é rude, pelo menos é um espetáculo meio nojento. E desperdiçando alimento, a menos que você queira pegar o que caiu e comer de novo, babando menos da segunda vez. O que por sua vez seria outro espetáculo nojento. Mas não tem problema, a etiqueta diz "babe à vontade, é para isso que colocamos um guardanapo no seu colo". Então tá bom. Eu babo.
Outra coisa curiosíssima é o fio da faca voltado para o prato. É uma das coisas que mais me dá aflição. Tendo a achar revoltante aquele calombo serrado no que seria uma reta tangente a um círculo. Fica feio. Mas o fio da faca tem que ficar pra dentro pra você não matar a pessoa que está ao seu lado. Pelo menos nos tempos antigos, eu imagino que assassinatos à mesa fossem comuns, então assim como um samurai deveria colocar a espada do lado direito, tornando o saque mais difícil, você deveria virar a faca para dentro, para não cortar a jugular do seu acompanhante com tanta facilidade. Ainda pode-se ter essa cautela hoje, mas se você está preocupado com isso, podia também se preocupar mais com as pessoas com quem come. E, se estiver pensando em segurança tanto assim, melhor usar um capacete contra as bandejas dos garçons.
Ah, não, você não pode. Porque sentar-se à mesa com alguma coisa na cabeça é indelicado. Isso já é um motivo religioso, o que logicamente deveria ser menos lógico, mas eu até penso ser mais. Particularmente, não costumo usar chapéus, bonés e coisas do tipo porque estragam o penteado e, durante as refeições, fazem uma sombra pentelha que conflita com meu gosto de comer em locais bem iluminados. Contudo, se o cara quiser tomar sopa pelo buraco de ventilação da máscara de Darth Vader dele, eu não tenho nada com isso nem vou achar ruim. Correção: não vou achar mais desagradável que o fato de eu estar tomando sopa com um cara usando máscara de Darth Vader. O que por sua vez não vai ser mais desagradável que o fato de não ser eu usando a máscara.
Tem o negócio de usar os garfos certos, também. E facas certas. E colheres certas. É tipo um caça-níqueis, conseguiu os três combinando, ganhou. Particularmente eu acho muito fácil distinguir os talheres e usá-los corretamente, difícil é aceitá-los. Você já tem a faca perfeitamente boa para todas as coisas, por que criar uma faca toda torta e sem fio nenhum? Para cortar algo mole, claro. E aí surge a faca de peixes. Que consegue um resultado levemente pior que a faca de carnes e dá problemas para canhotos. Por que diabos usamos essa faca, então? Por que ela foi criada? É um grande mistério. Acho que foi só pra sujar mais talheres. Puro lobby do Limpol e da Scotch-Brite. Eu pego o maior garfo sempre porque é nele que cabe mais comida e quanto mais comida estiver indo goela abaixo, melhor. Se alguém chamar minha atenção para o fato de eu estar espetando meu garfo em um alvo pouco propício, meu senso de justiça me manda levantar, gritar "AH, É?" e enfiar no olho do enxerido. Infelizmente as pessoas não dizem nada, só ficam pensando com os botões delas o quanto você é grosso, de modo que eu passei, preemptivamente, a espetar todo mundo. Não curto muito a idéia de talheres de sobremesa, também. Já tem um garfo sujo. Lamba-o bem e passe à torta, sem baitolagens.
Aliás, pensando bem, ter que usar talheres já é um porre. Eu uso, até porque não gosto de ficar sujando minha roupa, mas se o cara quiser enfiar a cabeça no prato de feijoada enquanto estraçalha um frango com os dedos inquietos, eu não ligo. Não se ele estiver usando o guardanapo no colo. Comer sem talheres, bem Medieval Times, mesmo, é algo que eu quero fazer se um dia for ao Terraço Itália.
Palitar os dentes também não pode. Chique é ter um baita fiapo de bacalhau nos dentes. Pra mostrar que comeu coisa cara.
Mas mais preocupante é o negócio de não se esticar pela mesa para pegar alguma coisa. Em vez de se debruçar, você tem que incomodar três ou quatro pessoas para te passarem uma bandeja pesada. Depois incomodar todo mundo de novo para passá-la de volta. E parar de comer porque alguém já quer que você passe a bacia de arroz. Muito mais fácil se esticar, se o seu braço alcança. Só não é muito legal se você estiver de gravata, salvo se for da mesma cor do caldo do feijão, que é onde ela vai parar.
Fora isso tem as palhaçadas de levantar para cumprimentar gente e um monte de outros aborrecimentos. Os defensores da etiqueta vão vir com "mas não é assim, é mostrar que você se importa - o gesto é que conta". Eu espero que não! Caso contrário o que significaria a cortesia de abrir a porta do carro para uma mulher? "Olha, sua estúpida, eu tenho que vir até aqui porque duvido que você consiga operar esse mecanismo chamado maçaneta"? Ah, se fosse seria mais nobre. É mais um "Hahaha! Vou papar você!"*. Isso era coisa verdadeiramente útil quando as mulheres precisavam de ajuda para subir naqueles carros altos enquanto usavam saias enormes e de vinte camadas de pano. Num calor de quarenta graus, no Rio de Janeiro. Nesse caso é algo besta e fora de contexto derivado de algo já besta e fora de contexto, a utilização de roupas européias aqui no Brasil.
Bom, é tudo um punhado de coisas que a gente faz pra se sentir bacana. Mas tudo é, por mais que você tente apresentar outros motivos.
*dizer em voz alta essa frase enquanto abre a porta para uma garota pode ser bem legal
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Há 3 meses
Um comentário:
eu não acho frescura, penso que é consideração com o próximo não se emporcalhar. Tem gente que come feio demais, faz barulho, suja tudo, nossa ! Pra mim é incômodo e eu prefiro comer só, se for pra ver um infeliz palitando os dentes na minha frente. Não custa nada ir ali no banheiro.
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