“-Bom dia, doutor. Tudo bom com o senhor?
-Ah, tudo ótimo, tudo ótimo. E contigo, tudo bom?
-Naquelas, naquelas. O que é bom, porque se ficar bom demais, a gente relaxa.
-Grande verdade.
-E então, o que posso fazer pelo doutor hoje? Quer mais um saco de cinco quilos? O Rufus deve estar se empanturrando esses dias, hein?
-Pois é, rapaz, o Rufus morreu.
-Morreu?
-É.
-Coitado. Meus pêsames.
-É...
-...
-...
-E o que é que eu posso fazer pelo doutor?
-Ah, é verdade. Eu vim pedir o meu dinheiro de volta.
-Seu dinheiro de volta, doutor? Não entendi.
-Bom, eu comprei sua ração para o meu cachorro e ele morreu. Eu gostaria de ser reembolsado.
-Hã... isso é muito incomum, doutor.
-Eu não vejo nada de incomum. Meu cachorro comeu sua ração e morreu, então eu no mínimo gostaria do meu dinheiro de volta. Olhe aqui, eu trouxe o resto do pacote para o senhor.
-Deixe-me ver... parece estar dentro da validade. O cheiro está bom. Nada de errado.
-Claro que tem algo errado. Quer que eu traga o corpo do meu cachorro para provar?
-Doutor, do que o Rufus morreu?
-O veterinário disse que foi 'esmagamento craniano'. Provavelmente influenciado pelo caminhão que o atropelou.
-Ahã... ok... e desculpe incomodar, mas o doutor pode me dizer qual a relação desse evento com a ração?
-Não consigo imaginar nenhuma, na verdade.
-Então eu gostaria que o doutor me explicasse o porquê de eu dever retornar o dinheiro.
-Ora, não se faça de besta. É muito simples: por que eu compraria ração para o Rufus?
-Bom, os cachorros precisam comer.
-E por quê?
-Porque senão eles morrem, doutor.
-Isso. Eu comprei a ração para evitar que meu cachorro morresse. Não funcionou. Então eu exijo meu dinheiro de volta. E francamente, não esperava toda essa petulância por parte do senhor. Sou cliente antigo e achei que seria tratado com o mínimo de respeito.
-Certo, doutor, mas seu cachorro digeriu a comida, processou-a, fez uso dela.
-Quer que eu devolva as fezes dele também? Posso trazê-las, embora ache isso ultrajante.
-Não, meu doutor. Preste atenção, por favor: seu cachorro fez bom uso da ração. E continuaria vivo à base dela se não fosse pelo caminhão.
-Não venha querer se escorar em tecnicalidades. O senhor sabe muito bem que é sua responsabilidade moral devolver o dinheiro que eu gastei aqui em vão tentando manter meu cachorro vivo à base dos seus produtos chinfrins. E o senhor vai me devolver todo meu dinheiro ou eu vou meter processo atrás de processo nessa lojinha barata até deixá-lo sem nada, nem o que comer além desse resto de ração que estou devolvendo. E deixo-a para que o senhor a coma, seja atropelado por um caminhão e então entenda meu ponto de vista!
-Olhe, eu vou dar ao doutor o dinheiro, mas unicamente porque já estou no ponto em que ou pago ou estrangulo-o com suas próprias tripas, gritando o quão miserável e louco o senhor é.
-Pronto! Foi tão difícil? Pelo amor de deus!
-Tome esta merda de dinheiro e não dê mais as caras por aqui.
-O que é isto?
-É dinheiro, doutor. É dinheiro. Pegue e vá embora.
-Tem quarenta reais aqui.
-Qual o problema? Quer trocado? O valor exato? Não tenho, pode ficar com o troco, só vá embora.
-Meu senhor, o Rufus tinha treze anos.
-E daí?
-Treze anos sendo alimentado com ração daqui. Eu calculo que o senhor me deva cerca de seis mil reais. E isso porque sou bonzinho e não estou cobrando os juros...
E foi assim que eu vim parar aqui, meritíssimo.”
A pequena grande Triumph: como é a Speed 400
Há 3 meses
3 comentários:
hahuaauhauhahahah!!!
meus comentários super produtivos, aiai.
muito bom! o ócio te cai bem.
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