quarta-feira, 30 de setembro de 2009

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

É Uma Versão Sem Palhaçadas

É por isso que os jovens não lêem os clássicos: eles são umas merdas. Veja Hamlet, por exemplo. Mesmo que valha a pena pela história, quando o personagem cuja fala urge explica a necessidade de ser sucinto com "meu rei e madame, postular o que a majestade deveria ser, o que o dever é, por que o dia é dia e noite, noite e o tempo é tempo seria nada além de desperdiçar dia, noite e tempo. Então, sendo a brevidade a alma da inteligência, e o tédio seus membros a florescerem em expansivamente, serei breve...", o interesse dessa geração DDA da qual eu orgulhosamente faço parte vai embora com alguma pressa. Então, fazendo minhas parte pela revitalização da literatura no planeta, eu melhorei a obra daquele enrolão do Shakespeare. Nada de lenga-lengas, nada de devaneios. Para adequar a obra, foi só necessário a tolher: uma amassadela-chave e PAM - neoclássico instantâneo na mão. E aí está, abaixo. Sintam-se livres para apresentá-lo em teatros, desde que não se importem de eu ter parado minha releitura interpretativa no segundo ato, o que deixa a história meio anticlimática. A menos que seja completada, naturalmente. Eu sugiro mágicas com cartas. Enfim, sem mais delongas, minhas ou da versão original:

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Hamlet:

---ATO I:

---CENA I: Elsinore.

Bernardo: Chega aí.

Chicão: Opa. Certo?

Bernardo: Certo. Sai fora, Chicão, eu cubro tua guarda aqui.

Chicão: Valeu, velho, tá um frio da porra.

Bernardo: E correu tudo certinho?

Chicão: De boa.

Bernardo: Ô, se você encontrar o Horácio e o Marcelão manda aqueles filhos dumas putas virem pra cá logo.

Chicão: São eles ali não, ó?

ENTRAM HORÁCIO E MARCELÃO, OS FILHOS DUMAS PUTAS.

Horácio: E aí, que é que manda?

Marcelão: Opa!

Chicão: Tô indo dormir, se fode aí no frio vocês três.

Marcelão: Tá indo, já? Quem que vai cobrir tua guarda?

Chicão: Porra, Marcelo, o Bernardo. Olha ele aqui do meu lado, seu retardado. Tá chapado de maconha de novo?

Marcelão: Ah. Só.

CHICÃO SAI FORA

Marcelão: Aí, Bernardo.

Bernardo: Opa. O Horácio tá aqui?

Horácio: Caralho, lógico que tô. Essa porra é Hamlet ou Ensaio Sobre a Cegueira, cacete?

Bernardo: Ah. Bom, beleza.

Marcelão: Ô, apareceu o negócio de novo?

Bernardo: Rolou não, velho.

Marcelão: Horácio diz que é coisa da erva, mas rola um fantasma por aqui.

HORÁCIO GESTICULA UM CIGARRO SENDO FUMADO

Bernardo: Ô, pior que rola mesmo, velho.

Horácio: Ô se rola. Conta de novo a lorotinha pra mim, conta, seu maconheiro.

Bernardo: Bom, ontem eu tava aqui com o Marcelão enrolando um e

FANTASMA ENTRA

Marcelão: Caralho, velho, tá aqui, olha lá.

Bernardo: Aí, ó. Falei. Chupa, Horácio. E é igualzinho o rei, não é?

Marcelão: Tu é nerd, Horácio, fala com o fantasma.

Horácio: Porra, parece o rei mesmo. Tô me borrando todo.

Marcelão: Fala com ele, Horácio.

Horácio: Ô Gasparzinho, que é que você está fazendo aqui? Anda, vai falando, seu merdinha.

Marcelão: Porra, tu ofendeu ele.

Horácio: Fala! Fala, filha da puta! Fala!

FANTASMA SAI

Bernardo: Aê, Horácio bichinha! Todo se cagando nas calças. Não era mentira, seu escrotinho? Lorota? Papo de fumado?

Horácio: Zoado, bicho...

Marcelão: Não parecia com o rei?

Horácio: A gente já concordou que sim, Marcelão. Cacete.

Marcelão: Ah, é.

Horácio: Suspeito esse bicho aparecer agora, hein?

Marcelão: Pois é. A gente se preparando pra guerra aí eu nem sei o porquê...

Horácio: Porque você fica doidão o dia todo, Marcelão, caralho. A gente tá em guerra por causa de umas disputas de terra do nosso rei, jaz defunto como fez questão de se mostrar há uns segundos. Ele catou umas terras de um Fortinbras, provavelmente porque não tem problema tirar terra de gente com nome engraçado, e matou o cara, porque nosso rei era um sacana, mesmo. E reza a lenda que o filho dele vem à desforra. E... ai, cacete, olha ele aí de novo.

FANTASMA VOLTA

Horácio: Fica aí, fantasma. Se você fala, fala. Se peida, peida. Mas emite uma porra de um som e fala com a gente.

UM GALO CANTA

Horácio: Galo de merda. Então, fantasma, diz aí, vai. Se você tem algo importante pra falar, fala.

Marcelão: Ô, vou espetar ele com a lança.

Horácio: Porra, MArcelão, eu tô... tá, vai. Espeta esse corno.

Bernardo: Toma!

Horácio: Toma!

Marcelão: Ih, fez puf!

FANTASMA SAI

Marcelão: Heh. Não dá pra espetar fantasma, né?

Bernardo: Ele ia falar alguma coisa quando o galo cantou.

Horácio: Bom, fantasma não deve ficar aparecendo durante o dia, né? Sei lá. De qualquer forma, vamos contar pro Hamlet.

Marcelão: Ah, beleza, o que vocês decidirem aí tá bom.

---CENA 2: Dentro do Castelo

ENTRAM REI CLÁUDIO, RAINHA GERTRUDE, HAMLET, POLÔNIO, LAERTES, VOLTIMAND, CORNÉLIO E UNS FIGURANTES

Cláudio: Bom, moçada, é isso aí. Meu irmão, o rei Hamlet, morreu e eu tomei o lugar dele. Como governante. E como a mulher dele! Hahahaha! Ai, ai... Mas sério, tô comendo, mesmo. Ah, o Fortibras tá a fim de foder com a gente e tá arrumando um exercitozinho, então eu resolvi contar tudo pro tio dele, um velho moribundo. Cornélio, Voltimand, vocês levem esta carta aqui pra ele, tá?

Cornélio e Voltimand: Sim, nessas e em todas as demais coisas nós serviremos ao senhor.

Cláudio: Credo. Que fanáticos.

SAEM VOLTIMAND E CORNÉLIO

Cláudio: E aí, Laertes? Qual é a boa?

Laertes: Tô voltando pra França. Eu vim pra festinha de coroação, mas agora que acabou, vou sair fora. "Barriga cheia, pé na areia", sabe como é.

Cáudio: Polônio, o que é que você acha?

Polônio: Legal.

Cláudio: Legal, então. Agora, Hamlet, filhão...

Hamlet: (murmurando) Odeio esse merdinha...

Cláudio: ...como é que tá indo?

Hamlet: meh.

Gertrude: Hamlet, tira essa roupa preta. Tá parecendo um emo.

Hamlet: Pô, mas eu tô triste ainda pelo meu pai. Ele mal acabou de morrer.

Cláudio: Menino, nas palavras de Ivan Drago, "se morrer, morreu". Agora pára de viadagem. E não vai pra escolinha em Wittenberg, não. Fica por aqui, vai.

Gertrude: Só.

Hamlet: Tsc. Tá bom.

Cláudio: Ótimo.

SAI TODO MUNDO MENOS HAMLET

Hamlet: Caralho, minha mãe é uma vagabunda, mesmo. Mal meu pai morre e ela já corre a dar pro meu tio.

ENTRAM HORÁCIO, MARCELÃO E BERNARDO

Horácio: Fala, moleque!

Hamlet: Fala, Horácio. E aí, o que é que você está fazendo aqui?

Horácio: Matando aula.

Hamlet. Pf. Você é um puta CDF. Fala śerio.

Horácio: Vim ver teu pai ser enterrado.

Hamlet: Veio é pro casamento da minha velha, seu corno.

Horácio: Bom, eu já estava por aqui mesmo...

Hamlet: Minha mãe é uma vadia, hein? Eu acho que ando vendo meu pai.

Horácio: Hã... onde?

Hamlet: Na minha cabeça.

Horácio: Teu pai era gente boa.

Hamlet: Eu acho.

Horácio: É, eu vi ele ontem.

Hamlet: Quem?

Horácio: Teu pai, sua anta.

Hamlet: Meu pai!

Horácio: Bom, o fantasma dele. Todo armado. Duas vezes.

Hamlet: Onde?

Marcelão: Num lugar aí em que a gente estava.

Hamlet: E falaram com ele?

Horácio: Eu falei. Mas ele não falou nada. Um galo cantou, se isso ajuda.

Hamlet: Que esquisito.

Horácio: Então... e aí a gente veio te contar.

Hamlet: E vocês vão pra esse lugar de novo hoje?

Marcelão e Bernardo: Vamos.

Hamlet: Armado, você disse?

Marcelão e Bernardo: Foi.

Hamlet: Dos pés à cabeça?

Marcelão e Bernardo: Dos pés à cabeça.

Hamlet: Então vocês não viram a cara dele?

Horácio: Ah, sim, ele usou a máscara da armadura levantada.

Hamet: E ele parecia puto?

Horácio: Meio triste.

Hamlet: Branquelo ou coradinho?

Horácio: Branquelo.

Hamlet: Ele olhou pra você?

Horácio: Ahã.

Hamlet: Merda, eu devia ter estado lá.

Horácio: Você ia se borrar.

Hamlet: É provável, é provável. Ele ficou muito tempo?

Horácio: Deixa eu ver... mais ou menos o tempo de alguém contar até cem, de um modo mais ou menos apressado.

Marcelão e Bernardo: Mais tempo!

Horácio: Nem fodendo.

Hamlet: Hum... barba grisalha?

Horácio: É.

Hamlet: Legal, vou lá ver hoje.

Horácio: Ele deve vir.

Hamlet: Tá. Então vou lá falar com ele. Encontro vocês lá.

Todos: Tá bom, ué.

Hamlet: Tchau.

TODO MUNDO SAI, MENOS HAMLET

Hamlet: Meu pai morto e armado. Vai dar merda.

---CENA III: Casa de Polônio

ENTRAM LAERTES E OFÉLIA

Laertes: Tô vazando. Me liga.

Ofélia: Pode deixar.

Laertes: Ah, e não dá pro Hamlet, não. Ele deve querer te comer com boas intenções, mas vai se desinteressar logo. Ele vai ser rei, afinal das contas.

Ofélia: Vou tentar.

Laertes: Olha papai.

ENTRA POLÔNIO

Polônio: Moleque, entra já nesta porra deste barco. Tô avisando!

Laertes: Tô indo. Falou, Fefélia.

SAI LAERTES

Polônio: Que foi que ele te disse, Ofélia?

Ofélia: Algo sobre o Hamlet.

Polônio: Tá dando pra ele, sua vadiazinha?

Ofélia: Não, mas ele tá me cantando direto.

Polônio: sai fora, cacete. Esse cara é só conversinha, vai te comer e sumir. Tá na idade dos hormônios.

Ofélia: Se você diz, ok.

---CENA IV: Naquele Canto do Começo

ENTRAM HAMLET, HORÁCIO E MARCELÃO

Hamlet: Tá frio pra cacete. Que horas são?

Horácio: Quase meia-noite.

Hamlet: Não, já passa de meia-noite.

Horácio: Ah, é? E se você sabia, seu merda, por que perguntou? Bom, daqui a pouco chega o fantasma.

TROMPETES TOCAM

Horácio: Que merda é essa?

Hamlet: Frescura do Cláudio. Ele gosta que toquem trompete enquanto ele mata shots de tequila.

Horácio: E é um costume?

Hamlet: Só se for um costume de bêbados, como as nações vizinhas devem pensar.

Horácio: Ê, o fantasma!

ENTRA FANTASMA

Hamlet: Ê, pai morto. O que é que você quer?

Horácio: Parece que ele quer falar contigo sozinho.

Marcelão: Vai não.

Horácio: É, vai não.

Hamlet: Eu vou lá.

Horácio: Caralho, Hamlet!

Hamlet: Do que é que eu devia ter medo? Minha vida não vale nada. E minha alma, se eu tiver, é imortal, não é?

Horácio: E se ele te possuir, te amedrontar e te aterrorizar até o ponto da loucura? Até você ser só uma casca de homem, um doido sem valor, uma desgraça vergonhosa para todos os que te conhecem e até para você mesmo? Ele pode arruinar sua vida.

Hamlet: É, tem isso. Mas eu vou, Tô curioso.

Marcelão: Tu vai o caralho.

Hamlet: Tira a mão!

Horácio: Você não vai, não.

Hamlet: Tira essa porra dessa mão! Sai fora! Me solta e me deixa ir sozinho!

SAEM HAMLET E FANTASMA

Horácio: Ele é doido.

Marcelão: Vamos atrás?

Horácio: Por quê?

Marcelão: Tem algo de podre no reino da Dinamarca.

Horácio: Que sera, sera.

Marcelão. Não, bora atrás dele.

---Cena V: Outro Lugar Desse Mesmo Lugar

Hamlet: Tá, cansei. Abre o bico.

Fantasma: Então ouve.

Hamlet: Tô ouvindo, anda.

Fantasma: Eu logo vou sumir.

Hamlet: Tadinho.

Fantasma: Cala a boca e me escuta.

Hamlet: Já falei que tô ouvindo.

Fantasma: Ótimo. Ouve e me vinga.

Hamlet: Hein?

Fantasma: Eu sou o espírito do seu pai. Me assassinaram.

Hamlet: Assassinaram!

Fantasma: É. Foda, né? Teu tio que me matou.

Hamlet: Meu tio!

Fantasma: Pára de repetir, cacete. É, teu tio. Que ainda por cima tá comendo minha mulher. Por cima, por baixo, de várias formas. Porra. E ainda por cima o cara é feio de dar dó. Não sei como ele seduziu minha gracinha inocente.

Hamlet: ...

Fantasma: Bom, é sua função acabar com essa palhaçada. Mata seu tio, deixa sua mãe viva, ok?

FANTASMA SAI

Hamlet: Hum... vamos ver como eu vou lidar com o cretino e com a puta, então.

Marcelão e Horácio: (sussurrando) Ixe!

Hamlet. Beleza. É isso aí.

Horácio: Opa. Oi, Hamlet. Você por aqui?

Hamlet: Ah, Horácio. Tudo certo?

ENTRAM HORÁCIO E MARCELÃO

Marcelão: E aí, como foi?

Hamlet: Legal.

Horácio. Ótimo. Conta aí.

Hamlet: Não posso. É se-gre-do!

Horácio: Não conto pra ninguém.

Marcelâo: Nem eu.

Hamlet: Hum... tá bom. Tem um filho da puta na Dinamarca.

Horácio: Dã. E daí?

Hamlet: Bom... aí é da minha conta. Ei, não contem pra ninguém o que aconteceu aqui hoje, hein?

Horácio e Marcelão: Não contaremos.

Hamlet: Juram?

Fantasma: Jurem!

Hamlet: Nunca vão falar disso. Juram?

Fantasma: Jurem!

Hamlet: Sério, não pode!

Fantasma: Jurem!

Horácio: Isso é meio esquisito, mas eu juro.

Hamlet: Cala a boca, fantasma! Cacete! Tá atrapalhando!

ELES JURAM

Hamlet: Então tá feito. Ai, ai, como eu sou um fodido. Vou ter que consertar uma baita cagada, viu? Bom, nós três vamos ter que consertar, agora. Se foderam.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Com Nexo Inchado

-Oi.
-Oi.
-Tá comendo coxinha, é?
-... tô.
-Legal. Sabe como eles fazem?
-Hã... tem a massa, eles enchem de frango...
-É. Mas sabe como eles matam o frango?
-Olha, eu realmente não quero saber.
-Eles quebram o pescoço do bichinho. Faz "croque".
-Meu senhor, você pode me deixar comer em paz?
-Aí eles tiram as partes nobres, moem os restos indesejados e socam dentro dessa massa.
-Ô garçom, fecha a conta pra mim, por favor?
-Que é puro óleo, aliás. De má qualidade. Seboso e cheio de toxinas.
-Você é um desses vegetarianos malucos, é?
-Não, não. Eu sou um tarado maluco.
-Oi?
-Oi. Eu te achei bonita, então estou te seduzindo.
-...
-Então. Deixa eu te contar agora como fazem salsichas.
-Em que tipo de terra esquizóide isso se classifica como sedução?
-Bom, você vai querer me fazer parar de falar. Um jeito de fazer isso é ocupando minha boca com um beijo.
-É, e o outro é enfiando esse copo na sua cara.
-Então minha chance de sucesso é de 50%. Não é tão ruim.
-Esse é um raciocínio... ruim. Cadê a porra da conta?
-Deve estar vindo. Eles estão cheios, hoje.
-O lugar está vazio.
-De clientes, sim. Mas as baratas estão fazendo a festa pela cozinha, demora pra matar todas.
-Você não desistiu ainda desse plano maluco?
-De modo algum. Tenho tido sucesso.
-Bom, em alas psiquiátricas, talvez.
-Em alas psiquiátricas eu tenho outros métodos.
-É?
-É.
-Eu não quero perguntar quais são.
-Não pergunte.
-Quais são?
-Depende da garota. Eu sempre posso batucar ritmos irregulares perto de meninas com TOC, por exemplo.
-Batucar? Mas aí elas não vão querer ocupar sua boca, vão... ah. Que nojento.
-Ótimo. Mato dois coelhos com uma só cajadada: te seduzo e ainda tenho uma conversa agradável.
-Bom, desde que não chegue perto de mim com essas mãos cheias de fluidos de garotas com TOC...
-Em primeiro lugar, não é algo contagioso. Em segundo, eu sou mais direto, não batuco com as mãos.
-Eca. Você precisa entender que eu estou ficando mais enojada a cada segundo e isso não está te ajudando.
-É, eu sei. Tem que chegar a um ponto específico de desespero. Já já a gente alcança.
-Tá... eu vou processar esse restaurante por demorar demais para trazer a conta.
-Eu acho que não se pode fazer isso. Você é louca?
-Você está me acusando de ser louca? Você?
-Acusando não; perguntando. Pra eu poder mudar minhas táticas.
-Certo. Não, não sou. Ah, minha conta está chegando. Tchau, lunático.
-Pus!
-Hein?
-Pus! Também conhecido como suquinho de infecção, lá em casa! A gente bebe.
-Ah, tá ficando desesperado? Bom, já era. Você tem o tempo de eu preencher um cheque.
-Gordo! Gordo pelancudo! Gordo pelancudo malcriado! Gordo pelancudo malcriado velho! Faustão!
-Vou te dar uma chance, hein? Estou fazendo nominal ao estabelecimento.
-Badalhocas! Ary Toledo pagando um boquete! Um cão sarnento cagando num bebê estripado! Espartalhões!

Seguiu-se uma miríade de nojeiras. E, realmente, como num passe de mágica, um impulso, um espasmo irresistível fez com que a moça se debruçasse, lábios se encontrassem e fosse realizado o planejado beijo. Que durou por cerca de trinta segundos, enquanto o espasmo fazia o resto do seu trabalho, de descartar bile e alguma miscelânia de conteúdos estomacais.

Eu espero que essa história não tenha sido nojenta demais para você. Mas, se foi, me liga, beibe.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Democracia Nos Ri

Morreu mais um desses atores famosos, porém nem tanto, de Holywood. Ao final da gravação de um filme, junto com uma atriz coadjuvante de menor expressão, num pequeno incêndio que se deu no set. Foi algo horrível, sem dúvida nenhuma, completamente desnecessário e um desperdício tremendo de recursos o tanto de homenagens póstumas, vídeos no Youtube, choradeiras, especiais do Fantástico etc.

O maior frufru de todos, contudo, viria na cerimônia do Oscar, na forma de um pequeno vídeo. Algumas de suas falas retiradas do contexto para parecerem mais marcantes. Falas retiradas dos filmes dos quais participara, tiradas das bocas de seus pares românticos, Betty, Sharon, Mimi e Porky, dizendo, respectivamente, quão inesquecível ele era, quão amado sempre seria, como seus olhos castanhos expressavam a verdade e como sua jeba era enlouquecedora (essa foi lá do comecinho da carreira). Seguiram-se aplausos e mais aplausos. O encarregado de dizer algumas bondosas palavras, o diretor do filme no qual durante a rodagem o defunto passou a poder ser assim denominado, o fez graciosamente, em nenhum momento deixando de pensar no quanto a perda de tão jovem vida significava para ele - milhões e milhões de dólares a mais em ingressos.

Seguiu-se uma homenagem semelhante à atriz em decomposição. Algumas de suas falas retiradas do contexto para parecerem mais marcantes. Falas de Betty, Sharon, Mimi e Porky, dizendo, inclusive, como sua jeba era enlouquecedora. Perturbadoramente semelhante, a homenagem. Só tiveram o trabalho de mudar as cenas em que ele aparecia por algumas dela. Isso deixou metade do povo - a metade que não estava a pensar "ei, eu já vi isso antes em algum lugar..." - um tanto quanto transtornado, murmurando "que bissurdo".

Um ou outro de maior poder abstrativo, infelizmente ausentes, poderiam ter imaginado que não haveria motivo algum para revolta. Em primeiro lugar, a morta não estaria a se importar com suas homenagens póstumas, de qualquer forma, haja ou não vida post mortem. Se não há, ela não estaria nem poderia estar indignada e caso encerrado. Se há, pressupõe-se que os defuntos tenham mais o que fazer além de ficar acompanhando o que está ou não sendo dito a respeito de suas ex-vidas. Pelo menos de acordo com o que é dito por aí pelas religiões. Caso não haja nenhuma atividade mais interessante, é bem provável que a morte seja um passaporte para o tédio completo e o que se diz ou não a respeito de um morto seja de menor importância frente à semiexistência vazia que ele vai ser obrigado a suportar. A segunda.

Além de pessoas ficarem indignadas por um teórico desrespeito pelo qual o maior interessado, o desrespeitado, está pouco se fodendo, o outro elemento curioso do evento era a percepção desse desrespeito. É bem verdade que o trabalho cheirava a preguiça ou correria, mas até aí não havia problema nenhum. Se não houvesse homenagem, estariam todos indiferentes. Como houve uma não exatamente boa, houve revolta. Se houvesse uma boa, ficariam emocionados e satisfeitos. Colocando isso em um gráfico, então, a parábola resultante sugeriria que pouco esforço despejado em honrarias é pior que nenhum esforço e nenhuma lembrança, o que é um tanto quanto esquisito.

Talvez fosse o tom de impessoalidade dado à coisa. Não, isso também não poderia ser. Afinal o primeiro vídeo, ao ator, havia sido feito por profissionais que estavam recebendo por um serviço de edição como outro qualquer, por gente que sequer o conheceu em vida. E o resultado havia sido igual aos outros trezentos vídeos homenageadores exibidos nessas cerimônias. A mesma fórmula, só com uma ou outra cena modificadas para que se pudesse identificar de quem diabos estavam falando. Como algo nesses moldes pode ser percebido como mais pessoal ou sincero que algo rascunhado às pressas preguiçosamente? É um mistério.

E enquanto eu me alongava com essas masturbações filosóficas, já tinha sido gerada uma certa comoção na cerimônia. Essa comoção só se acalmou com um breve discurso do já mencionado diretor, que ocupava o palco: "Senhoras e senhores, nós fomos pegos de surpresa pela morte dessa jovem. É sempre surpreendente quando uma vida termina, e duplamente quando é uma vida de alguém tão nova, tão... bom... cheia de vida. Olha, o que eu estou querendo dizer é que ninguém esperava que ela também fosse morrer no incêndio e nós tivemos muito pouco tempo para a preparação de um vídeo para a cerimônia, então infelizmente foi o melhor que pudemos fazer. Se não foi suficiente é porque a dor em nossos corações ainda é grande demais. Mas, de qualquer forma, eu não me importo com essa pífica homenagem. Eu sei que a verdadeira homenagem, o que verdadeiramente irá ficar e que a deixaria muito feliz, está no filme que ela ajudou a contruir. E eu espero que todos vocês possam vê-lo em breve." Seguiram-se muitos aplausos e algumas lágrimas.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Xona, Bixinho

Eu sei que já passou a moda e tudo mais, mas eu ainda sinto que preciso me expressar a respeito da onda do xixi no banho. Eu adotei uma posição de silêncio respeitoso. Sabe aquele silêncio digno, cheio de pompa, a quietude dos cautelosos? Pois é, grande merda. Xingar as coisas é muito mais gostoso. E eu me sinto bastante inclinado a xingar, basicamente, dois lados dessa história de xixi no banho: quem é pró e quem é contra. E todo e qualquer misto de opiniões a respeito, também, por que não?

Em primeiro lugar, vamos deixar bem claro que xixi no banho é uma idéia panaca. É, legal, economiza uma descarga. E uma descarga de oito litros por dia a cada cento e noventa milhões de idiotas, pra falar só no Brasil, é água pra cacete pra limpar água de cacete. Só que tem o chuveiro lá, jogando água pra baixo, de boa. E ele movimenta mais água que a descarga nesses trinta segundos em que você está se perguntando o porquê de o lançamento balístico de líquidos não ter distância máxima aos quarenta e cinco graus de inclinação. Você pode muito bem desligar o chuveiro durante a mijadinha, mas aí não é xixi no banho, é meramente xixi no ralo. A propósito, pela linha sobre lançamento balístico, você deve ter adivinhado que eu vou cobrir aqui mais as procupações masculinas com o problema. Eu - graças a deus - não tenho muita experiência prática com o urinar feminino. Mas já dá pra ver, pela teoria, que seria algo bem menos prático e altamente objecionável por parte das pernas.

Outra idéia seria você continuar se ensaboando/enxaguando durante o golden shower do seu piso. Isso traz dois probleminhas: a) você tem um esfincter. Ele é um negócio mais ou menos voluntário, mas perceba que você quase necessariamente precisa acioná-lo ao mudar o peso de uma perna pra outra. E ao fazer diversos outros movimentos. Isso é altamente desconfortável e vai afetar tremendamente sua performance, acredite em mim. É ae possível que você aprenda a controlar o esfincter separadamente, aperfeiçoando suas capacidades de mijar enquanto realiza diversas outras atividades. Eu suponho que esse tempo possa ser melhor investido no aprendizado do duplo twist carpado, mas cada um tem uma opinião diferente a respeito de como aproveitar o próprio tempo para aprender inutilidades. b) O outro problema de não parar de se mexer para o pipi é o mesmo problema que demanda que bombeiros não tentem dançar à polka enquanto tentam apagar incêndios. Nada contra paredes de box mijadas, mas eu suponho que você vá querer limpá-las com água que cai do chuveiro, usando as mãos como conchinhas e, de novo, aí está o desperdício de água. Caso você não queira limpar, não ligand para o cheiro de urina, não faz nenhum sentido eu estar aqui digitando para você. Mije por aí à vontade. Nas calças, no sofá, no cachorro, só de sacanagem. Mije ao trabalhar, mije ao cozinhar, mije durante o duplo twist carpado. Porra, tá aí uma manobra difícil. Com isso eu ficaria muito, muito impressionado.

Então xixi no banho é uma idéia panaca. Mas quem é contra geralmente diz que é porque é anti-higiênico ou alguma frescura semelhante. Puta que pariu sêxtuplos! Dá vontade de mijar do olho de um infeliz desses. É sempre um argumento escroto que se coloca por parte dos contrários à iniciativa. E isso é até mais ou menos previsível: tirando o argumento de baixa eficiência do plano, vagamente delineado no parágrafo anterior, não há mais coerentes. Eu, particularmente, teria lançado uma campanha melhor: xixi na pia. Seria mais revoltante, eu imagino, mas muito mais eficiente. A pia não representa desperdício nenhum. A água que vai limpar a porcelana é a mesma que você usaria, de qualquer forma, para lavar as mãos. Bom, que 12% da população masculina usaria, de qualquer forma, para lavar as mãos. O argumento do contra pode até vir, mas provavelmente só daquelas pessoas que costumam esfregar o rosto no fundo da pia e que não sabem que urina é hidrossolúvel.

Se vocês quiserem realmente fazer alguma coisa para ajudar o povo pra lá de imbecil do S.O.S. Mata Atlântica, que começou essa campanha, você pode tomar uma iniciativa: cocô no banho. Sério, já imaginou quantos bilhões de quilos de papel higiênico são utilizados só pra limparmos (mal!) nossas bundinhas? E tudo porque temos preguicinha de lavar nossos rabos direito? Então coma mamão todos os dias ou tome uma boa golada de óleo de rícino e borre-de de amores pela vegetação tropical.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Sem Anagrama Hoje

Em um determinado momento da história deste nosso planeta, havia dois homens intelectualmente fenomenais. Um deles, Giuseppe Toselli, formou-se em física nuclear, mecatrônica, química molecular, filosofia e medicina, e trabalhou fenomenalmente pelo avanço da ciência em todos esses campos. Foi celebrado pela humanidade como uma jóia e chegou a ganhar o prêmio Nobel seis vezes consecutivas em uma mesma cerimônia. O outro homem não fez nada disso, então é considerado vastamente superior. É ele quem vamos acompanhar.

Seu nome era Jorge Antumnes. Trabalhava como gari. E foi trabalhando como gari que encontrou um bilhete todo retorcido na calçada da cidade. Julgou ser, pela extensão do documento, uma notificação comovente de suicídio ou a maior e mais detalhada lista de compras do mundo, completa com diagramas do supermercado e planos alternativos para obtenção de cereais no caso de uma emergência. O peso para papel improvisado que o impedia de sair voando com o vento, um corpo fraturado e coberto de sangue, apontava para a primeira hipótese. Jorge olhou rapidamente em volta, identificando o momento em que nenhum dos mais de mil transeuntes curiosos dispostos em semi-círculo ao redor da cena estivesse prestando atenção, e surrupiou o papel. Pode até parecer uma atitude estranha, mas ele teve dois bons motivos. Quer dizer... não é tão estranho assim um gari catando papel da rua, mas ele não pegou por causa de seu dever. O papel que pertenceria à lata de lixo da prefeitura foi roubado por Jorge por um interesse pessoal. E isso é que é estranho. Tá, não que seja estranho funcionários públicos desviarem propriedade da prefeitura, mas... ah, esquece. Vamos aos dois motivos:

O primeiro era seu intestino preso. Como gari, ele não ganhava um salário exatamente opulento, o que o privava de adquirir iogurtes reguladores de intestino. Ou livros. Isso resultava em horas entediantes intermináveis de análise de azulejos. Jorge já seria um grande conhecedor do assunto e poderia ganhar muito dinheiro na área, não fosse por analisar todos os dias o mesmo azulejo. Infelizmente não havia mercado para alguém com tão alto nível de especialização. Tendo a intenção de evitar o desperdício de futuros estudos, ele buscava em sua profissão coisas interessantes, que pudessem entretê-lo durante suas horas menos nobres. O segundo motivo para o roubo do papel evidenciava sua inteligência: o corpo era muito pesado para se carregar. Além de que se daria por falta do cadáver com muito mais facilidade. Não fosse por esses detalhes muito astutamente observados, Jorge não só aproveitaria seus momentos de batalha intestinal para treinar suas capacidades de ventríloquo, mas teria também alguma companhia em casa para o horário das refeições, o que seria refrescante. Especialmente porque seria uma companhia que, como seus demais semelhantes na escala de transmutação para adubo, não acarretaria em gastos alimentares extras. De qualquer forma, não ficou a lamentar a oportunidade perdida de fazer um amigo que a vida desfez e deu-se por contente tendo sua distração menor para mais tarde.

E o mais tarde, nesse dia específico, veio mais cedo. Em parte por causa de uma barganha com um senhor inescrupuloso da barraquinha do centro que envolveu um pacote de batatas frias, refrigerante de fabricação local, dois cachorros-quentes, sendo um deles recondicionado, e as palavras “legalmente eu não posso vender isso para o senhor, mas...”, em parte por conta da expectativa quanto à sua primeira leitura em meses que não continha um capítulo para contra-indicações e efeitos adversos. Mas embora não fossem destacados, eles certamente estavam lá, em concentrações metafóricas acima da dose recomendada...

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Anencéfalo Repentinoso

Agora, se eu puder contradizer ou, ao menos, floccinaucinihilipilificar o conteúdo da mensagem anterior, permitam-me. É bem verdade que existem poucas pessoas bradando - diabos, existem poucas pessoas sussurrando - coisas úteis, significantes ou interessantes pelos blogs da vida. Não entrando no mérito de que sem dúvida alguma o fato de o Juninho ter dado uns pegas na Carlinha deva ser importante para a Cocotinha (aliás, sem dúvida, não - Cocotinha, sua escrota, não devia estar se importando com esse homem que não presta), a verdade é que muito do que se publica não é de interesse social. E muito menos intelectual.

Mas vamos pensar nisso direito: o que diabos se deve publicar? Como disseram certa vez que diria eu, se eu gosto de cagar na janela, ninguém tem nada a ver com isso. Perfeito. Então pode-se tudo. Mas o que é que faz alguma diferença? Tá, é outro debate infinito acerca do que é fazer diferença, mas vamos atochar a masturbação filosófica cu acima e simplificar ao máximo: o que deve ser expressado é simplesmente o que não costuma ser.

Isso é bastante óbvio. Num meio em que todo mundo diz "eu odeio mintira e injustissa :xxxx s/ scrap naum me add", eu quero ver sendo publicado "adoro estrupar criansinhas :xxxx me add aih frmz". Não que eu necessariamente ache um barato estuprar criancinhas (e não que eu não ache - deixe um comentário com seu endereço, aqui, se você tiver menos de doze anos, só por via das dúvidas), mas eu quero ver sendo exposto algo que geralmente não é. Porque o resto não precisa mais ser, macacada. O que não é contrário ao normal ou, no mínimo, inusitado, é demagogia. E pra isso eu tenho o Datena, o governo e mais setecentos outros nichos específicos de idéias gastas diferenciadas. Porcaria, pra isso tem gente na rua. Pra isso tem o velho que diz "que bissurdo" todo dia quando passa notícia de criancinha estrangulada e depois dá risada de Zorra Total*.

É mais ou menos como o doidão já disse: "não se preocupe com roubarem suas idéias - se elas forem boas, você terá que socá-las goela abaixo das pessoas". E é bem por aí. Se você decidir se esforçar, então que esteja contra alguma coisa. Porque caso contrário, por mim e pelas leis da cinemática, você pode ir embora. Então, sim, essa é a parte repugnante desses blogs de "oioioioioioi comprei meu iPooood XD" - fodam-se você e seu iPod. Uma caralhada de gente compra iPods e você está desperdiçando bits e bytes à toa. Está contribuindo para o encarecimento do tráfego e da hospedagem de informações valiosas na internet por causa das suas porcarias desinteressantes. Igualmente eu não me importo se você tiver terminado seu namoro, se estiver gostando da sua festinha, se estiver animado com o prospecto de dar uma bimbada esta noite. E isso porque eu não te conheço. É pra isso que se publica as coisas: para que elas cheguem a pessoas que não conhecemos. Caso contrário eu posso estabelecer uma linha de contato muito mais direta e pessoal, certo? Especialmente em se tratando de internet, o que se faz é jogar idéias ao vento e ver se elas chegam a algum lugar. E esses detalhes tão pequenos de vocês estão atrapalhando a anemocoria dos meus importantíssimos trocadilhos!

Então nada de ficar publicando detalhes da sua vida e nada de ficar repetindo idéias e sentimentos que todo mundo já conhece, ok? A menos que tenha algo original para colocar neles ou ao menos uma luz nova sob a qual pô-los. O que é que resta? Coisas que sejam contra coisas em número maior e coisas que não se sabe que são coisas. Mais ou menos isso? Ok. Isso seria teoricamente ideal, não? Tirando o fato de todos terem que ficar quase mudos quando as idéias de equilibrassem socialmente em volume, mas isso é algo que não poderia acontecer. Pelo menos não globalmente.

Opa. Que é o que traz problemas. Como eu mesmo já sabotei ali acima, existem nichos e nichos de discursos demagogos. Então, enquanto a idéia de estuprar criancinhas pode ser até já cansativa no meu nicho (toda terça à noite ali na loja da Harley na Cerro Corá, hein, pessoal? Pode aparecer e leva as que for consumir), é possível que não seja para outras pessoas. Como Zezinho dizendo "ai que flor linda dá vontade de apertar e depois cantar e aí socar o Janjão bunda adentro" em seu fotolog pode ser relevante de ele for um fazendeiro texano (pré-Brokeback). É lógico que é mais provável que ele seja só um emo de Perdizes, mas vá saber. A rede não faz distinções.

Em segundo lugar, essa noção de que ir contra o zeitgeist é de alguma valia é um negócio complicado. Lógico que você pode ter um porquê para gritar, espernear e se descabelar, mas ir contra o padrão não deve ser, de modo algum, um tipo de filtro. Nem devia fazer nenhuma diferença. Na verdade o título de contracultura e nossa simpatia para com ela é o que sempre a mata. Qualquer movimento legítimo que se torne expressivo vai acabar atraindo uma manada de idiotas de modo a perder o sentido. Aconteceu com os hippies, com os beats e com Star Wars.

O porquê está largamente aberto a especulação, mas eu diria, como de costume, que é porque as pessoas são umas idiotas. É natural, está no sangue. Nós estragamos as coisas. O movimento hippie foi uma beleza, quando surgiu. Gente desiludida com a sociedade, buscando uma alternativa. Olha que coisa boa. Ah, e drogas pra cacete. Olha que coisa boa. E Beatles. O que já fica meio não tão bom assim, mas a galera gosta, vá. O que foi que aconteceu com os hippies?

Eles foram pro saco. Como e quando exatamente é difícil precisar, mas é mais ou menos seguro dizer que pelo Woodstock as coisas já não iam tão bem e que pelo Altamont Free Concert tudo já estava podre. E hoje os ex-hippies são executivos, trabalham em escritórios e mandam seus filhos tirarem boas notas e obedecerem os professores. Mas tudo bem, porque sempre existem novas gerações de hippies, certo? Certo?

Eu acho que não. Peraí, vamos recapitular pra quem tem ADD: estávamos (e podemos retomar, no final) discutindo o que valeria a pena ser publicado. Eu disse que o que fosse contra o estabelecido deveria ser de alguma valia, mas sabiamente comecei a argumentar contra essa tese. E cheguei aos hippies como exemplo.

É verdade que não tem novas gerações de hippies hoje. Não se identifica uma geração idealista. O máximo que persiste são os mundrungos da faculdade que compram camisa de grife com a cara do Che, mas esses não se pode nem mencionar. Esse povo só é comuna pra comer menininhas (e devem perder feio pros capitalistas, porque esses têm carros além de papo-furado). Nosso grupo de subculturas (e não só aqui, mas globalmente) é de góticos, punks, emos etc. Nenhum desses grupos têm crenças ou bandeiras. Talvez originalmente tivessem, mas foram estragados ainda no começo. Talvez pelo próprio design, é verdade, mas ainda assim deveriam ter resistido um pouco mais.

Por que o que representa um emo? O que ele quer? Poder expressar suas emoções? Bicho, não tem ninguém te impedindo - faz isso à vontade, não precisa usar essas roupas babacas, o cabelinho nojento e se aglomerar com uma ganguezinha se vocês não têm, na verdade, nada em comum entre si a mais que com o resto das outras pessoas. Os punks, pelo menos, tinham alguma ideologia no meio daquelas desfigurações arbitrárias. Que a esta altura do campeonato já foi perdida. Aliás os punks não deixavam de ser hippies hardcore. E a ausência deles me faz perguntar de novo: cadê os hippies desta era?

Cadê o povo que é realmente subversivo? Não necessariamente destrutivo, mas um Larry Darrell da vida. Não tem? Ou finalmente aprederam que contracultura tem que ser algo individual? Lógico que não - as pessoas não aprendem coletivamente, assim, a pensarem de forma mais individual. O que acontece é que hoje a galera que seria hippie se interessa é por iPods, Macs, festinhas e não por uma linha filosófica. Deve estar ligado ao que ocasionou toda essa vontade das pessoas de serem "indies" - como não existe mais uma contracultura para se clamar um rompimento ideológico com o que está estabelecido, a galera usa música para alegar uma certa independência, mas essa música, em si, não exprime nada de único ou diferente. Se destacam por serem desconhecidas. Ou se destacavam, porque hoje até os que se chamavam de indies morreram e todos os seus artistas foram lançados no iTunes e são ouvidos em seus iPods, mp4s e tocadas por seus DJs de fundo de quintal. São um bando de neopaninari tecnófilos. Sabe o que, agora, mais passa perto da contracultura de antigamente? Sabe o que é que ainda é contra as autoridades, faz sucesso na música e é celebrado por aí em festas altamente subversivas? O Comando Vermelho cantando funk. É uma beleza: "meto tiro pela perna, pelas costas", "pra subir aqui no morro até o BOPE treme". Isso aí, moçada, beleza. Essa é a nossa "geração do amor". Flower Power neles, turma do Proibidão. Manda ver, Lil' Wayne. Mp3 na orelha e mp5 na mão.

Bom, não dá pra negar que aí esteja nossa contracultura. Francamente, eu preferia os hippies. Então eu acho que é isso que valeria a pena publicar hoje em dia, segundo eu mesmo há alguns parágrafos. Letras de funk. Os que eu mencionei acima cuidam da parte de serem contra a cultura vigente, mas ainda tem os "originais", as coisas novas, nas quais ninguém pensou ainda. Tipo Dança do Quadrado. Não faz quase nenhum sentido, que é o que quase garante sua originalidade. Crédito pro cara que inventou isso.

Então vamos voltar à estaca zero, deixar regras de publicação pra lá e aceitar os "adhoro meu mozin nhoooom :****", sabendo que a alternativa é a Dança da Motinha 2. Eu poderia e deveria discursar sobre o porquê de a contracultura estar sempre fadada a se degenerar e desaparecer, mas vai que algum representante da atual lê a respeito e acaba tendo uma boa idéia pra perpetuar o funk carioca. Não vou correr esse risco, não.

Não que tenha algo de errado com nada isso. É o curso natural das coisas e, a longo prazo, sabe-se lá se é bom ou ruim. Não dá pra dizer nem a curto. Mas, só pra encerrar, que a gente sente falta de uma geração idealista, sente. Devia ter grupos enormes de gente como o André Dahmer, não como o Dado Dolabela.

*Problema detectado P.S.: se ele ri todo dia de Zorra Total, então esse cara deve estar alucinando, dado que tal "programa" só passa aos sábados. A menos que ele tenha gravados alguns episódios, mas isso é ainda mentalmente mais preocupante que alucinações e - graças a deus - foge à normalidade. Considere o exemplo mesmo assim.