sexta-feira, 25 de setembro de 2009

É Uma Versão Sem Palhaçadas

É por isso que os jovens não lêem os clássicos: eles são umas merdas. Veja Hamlet, por exemplo. Mesmo que valha a pena pela história, quando o personagem cuja fala urge explica a necessidade de ser sucinto com "meu rei e madame, postular o que a majestade deveria ser, o que o dever é, por que o dia é dia e noite, noite e o tempo é tempo seria nada além de desperdiçar dia, noite e tempo. Então, sendo a brevidade a alma da inteligência, e o tédio seus membros a florescerem em expansivamente, serei breve...", o interesse dessa geração DDA da qual eu orgulhosamente faço parte vai embora com alguma pressa. Então, fazendo minhas parte pela revitalização da literatura no planeta, eu melhorei a obra daquele enrolão do Shakespeare. Nada de lenga-lengas, nada de devaneios. Para adequar a obra, foi só necessário a tolher: uma amassadela-chave e PAM - neoclássico instantâneo na mão. E aí está, abaixo. Sintam-se livres para apresentá-lo em teatros, desde que não se importem de eu ter parado minha releitura interpretativa no segundo ato, o que deixa a história meio anticlimática. A menos que seja completada, naturalmente. Eu sugiro mágicas com cartas. Enfim, sem mais delongas, minhas ou da versão original:

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Hamlet:

---ATO I:

---CENA I: Elsinore.

Bernardo: Chega aí.

Chicão: Opa. Certo?

Bernardo: Certo. Sai fora, Chicão, eu cubro tua guarda aqui.

Chicão: Valeu, velho, tá um frio da porra.

Bernardo: E correu tudo certinho?

Chicão: De boa.

Bernardo: Ô, se você encontrar o Horácio e o Marcelão manda aqueles filhos dumas putas virem pra cá logo.

Chicão: São eles ali não, ó?

ENTRAM HORÁCIO E MARCELÃO, OS FILHOS DUMAS PUTAS.

Horácio: E aí, que é que manda?

Marcelão: Opa!

Chicão: Tô indo dormir, se fode aí no frio vocês três.

Marcelão: Tá indo, já? Quem que vai cobrir tua guarda?

Chicão: Porra, Marcelo, o Bernardo. Olha ele aqui do meu lado, seu retardado. Tá chapado de maconha de novo?

Marcelão: Ah. Só.

CHICÃO SAI FORA

Marcelão: Aí, Bernardo.

Bernardo: Opa. O Horácio tá aqui?

Horácio: Caralho, lógico que tô. Essa porra é Hamlet ou Ensaio Sobre a Cegueira, cacete?

Bernardo: Ah. Bom, beleza.

Marcelão: Ô, apareceu o negócio de novo?

Bernardo: Rolou não, velho.

Marcelão: Horácio diz que é coisa da erva, mas rola um fantasma por aqui.

HORÁCIO GESTICULA UM CIGARRO SENDO FUMADO

Bernardo: Ô, pior que rola mesmo, velho.

Horácio: Ô se rola. Conta de novo a lorotinha pra mim, conta, seu maconheiro.

Bernardo: Bom, ontem eu tava aqui com o Marcelão enrolando um e

FANTASMA ENTRA

Marcelão: Caralho, velho, tá aqui, olha lá.

Bernardo: Aí, ó. Falei. Chupa, Horácio. E é igualzinho o rei, não é?

Marcelão: Tu é nerd, Horácio, fala com o fantasma.

Horácio: Porra, parece o rei mesmo. Tô me borrando todo.

Marcelão: Fala com ele, Horácio.

Horácio: Ô Gasparzinho, que é que você está fazendo aqui? Anda, vai falando, seu merdinha.

Marcelão: Porra, tu ofendeu ele.

Horácio: Fala! Fala, filha da puta! Fala!

FANTASMA SAI

Bernardo: Aê, Horácio bichinha! Todo se cagando nas calças. Não era mentira, seu escrotinho? Lorota? Papo de fumado?

Horácio: Zoado, bicho...

Marcelão: Não parecia com o rei?

Horácio: A gente já concordou que sim, Marcelão. Cacete.

Marcelão: Ah, é.

Horácio: Suspeito esse bicho aparecer agora, hein?

Marcelão: Pois é. A gente se preparando pra guerra aí eu nem sei o porquê...

Horácio: Porque você fica doidão o dia todo, Marcelão, caralho. A gente tá em guerra por causa de umas disputas de terra do nosso rei, jaz defunto como fez questão de se mostrar há uns segundos. Ele catou umas terras de um Fortinbras, provavelmente porque não tem problema tirar terra de gente com nome engraçado, e matou o cara, porque nosso rei era um sacana, mesmo. E reza a lenda que o filho dele vem à desforra. E... ai, cacete, olha ele aí de novo.

FANTASMA VOLTA

Horácio: Fica aí, fantasma. Se você fala, fala. Se peida, peida. Mas emite uma porra de um som e fala com a gente.

UM GALO CANTA

Horácio: Galo de merda. Então, fantasma, diz aí, vai. Se você tem algo importante pra falar, fala.

Marcelão: Ô, vou espetar ele com a lança.

Horácio: Porra, MArcelão, eu tô... tá, vai. Espeta esse corno.

Bernardo: Toma!

Horácio: Toma!

Marcelão: Ih, fez puf!

FANTASMA SAI

Marcelão: Heh. Não dá pra espetar fantasma, né?

Bernardo: Ele ia falar alguma coisa quando o galo cantou.

Horácio: Bom, fantasma não deve ficar aparecendo durante o dia, né? Sei lá. De qualquer forma, vamos contar pro Hamlet.

Marcelão: Ah, beleza, o que vocês decidirem aí tá bom.

---CENA 2: Dentro do Castelo

ENTRAM REI CLÁUDIO, RAINHA GERTRUDE, HAMLET, POLÔNIO, LAERTES, VOLTIMAND, CORNÉLIO E UNS FIGURANTES

Cláudio: Bom, moçada, é isso aí. Meu irmão, o rei Hamlet, morreu e eu tomei o lugar dele. Como governante. E como a mulher dele! Hahahaha! Ai, ai... Mas sério, tô comendo, mesmo. Ah, o Fortibras tá a fim de foder com a gente e tá arrumando um exercitozinho, então eu resolvi contar tudo pro tio dele, um velho moribundo. Cornélio, Voltimand, vocês levem esta carta aqui pra ele, tá?

Cornélio e Voltimand: Sim, nessas e em todas as demais coisas nós serviremos ao senhor.

Cláudio: Credo. Que fanáticos.

SAEM VOLTIMAND E CORNÉLIO

Cláudio: E aí, Laertes? Qual é a boa?

Laertes: Tô voltando pra França. Eu vim pra festinha de coroação, mas agora que acabou, vou sair fora. "Barriga cheia, pé na areia", sabe como é.

Cáudio: Polônio, o que é que você acha?

Polônio: Legal.

Cláudio: Legal, então. Agora, Hamlet, filhão...

Hamlet: (murmurando) Odeio esse merdinha...

Cláudio: ...como é que tá indo?

Hamlet: meh.

Gertrude: Hamlet, tira essa roupa preta. Tá parecendo um emo.

Hamlet: Pô, mas eu tô triste ainda pelo meu pai. Ele mal acabou de morrer.

Cláudio: Menino, nas palavras de Ivan Drago, "se morrer, morreu". Agora pára de viadagem. E não vai pra escolinha em Wittenberg, não. Fica por aqui, vai.

Gertrude: Só.

Hamlet: Tsc. Tá bom.

Cláudio: Ótimo.

SAI TODO MUNDO MENOS HAMLET

Hamlet: Caralho, minha mãe é uma vagabunda, mesmo. Mal meu pai morre e ela já corre a dar pro meu tio.

ENTRAM HORÁCIO, MARCELÃO E BERNARDO

Horácio: Fala, moleque!

Hamlet: Fala, Horácio. E aí, o que é que você está fazendo aqui?

Horácio: Matando aula.

Hamlet. Pf. Você é um puta CDF. Fala śerio.

Horácio: Vim ver teu pai ser enterrado.

Hamlet: Veio é pro casamento da minha velha, seu corno.

Horácio: Bom, eu já estava por aqui mesmo...

Hamlet: Minha mãe é uma vadia, hein? Eu acho que ando vendo meu pai.

Horácio: Hã... onde?

Hamlet: Na minha cabeça.

Horácio: Teu pai era gente boa.

Hamlet: Eu acho.

Horácio: É, eu vi ele ontem.

Hamlet: Quem?

Horácio: Teu pai, sua anta.

Hamlet: Meu pai!

Horácio: Bom, o fantasma dele. Todo armado. Duas vezes.

Hamlet: Onde?

Marcelão: Num lugar aí em que a gente estava.

Hamlet: E falaram com ele?

Horácio: Eu falei. Mas ele não falou nada. Um galo cantou, se isso ajuda.

Hamlet: Que esquisito.

Horácio: Então... e aí a gente veio te contar.

Hamlet: E vocês vão pra esse lugar de novo hoje?

Marcelão e Bernardo: Vamos.

Hamlet: Armado, você disse?

Marcelão e Bernardo: Foi.

Hamlet: Dos pés à cabeça?

Marcelão e Bernardo: Dos pés à cabeça.

Hamlet: Então vocês não viram a cara dele?

Horácio: Ah, sim, ele usou a máscara da armadura levantada.

Hamet: E ele parecia puto?

Horácio: Meio triste.

Hamlet: Branquelo ou coradinho?

Horácio: Branquelo.

Hamlet: Ele olhou pra você?

Horácio: Ahã.

Hamlet: Merda, eu devia ter estado lá.

Horácio: Você ia se borrar.

Hamlet: É provável, é provável. Ele ficou muito tempo?

Horácio: Deixa eu ver... mais ou menos o tempo de alguém contar até cem, de um modo mais ou menos apressado.

Marcelão e Bernardo: Mais tempo!

Horácio: Nem fodendo.

Hamlet: Hum... barba grisalha?

Horácio: É.

Hamlet: Legal, vou lá ver hoje.

Horácio: Ele deve vir.

Hamlet: Tá. Então vou lá falar com ele. Encontro vocês lá.

Todos: Tá bom, ué.

Hamlet: Tchau.

TODO MUNDO SAI, MENOS HAMLET

Hamlet: Meu pai morto e armado. Vai dar merda.

---CENA III: Casa de Polônio

ENTRAM LAERTES E OFÉLIA

Laertes: Tô vazando. Me liga.

Ofélia: Pode deixar.

Laertes: Ah, e não dá pro Hamlet, não. Ele deve querer te comer com boas intenções, mas vai se desinteressar logo. Ele vai ser rei, afinal das contas.

Ofélia: Vou tentar.

Laertes: Olha papai.

ENTRA POLÔNIO

Polônio: Moleque, entra já nesta porra deste barco. Tô avisando!

Laertes: Tô indo. Falou, Fefélia.

SAI LAERTES

Polônio: Que foi que ele te disse, Ofélia?

Ofélia: Algo sobre o Hamlet.

Polônio: Tá dando pra ele, sua vadiazinha?

Ofélia: Não, mas ele tá me cantando direto.

Polônio: sai fora, cacete. Esse cara é só conversinha, vai te comer e sumir. Tá na idade dos hormônios.

Ofélia: Se você diz, ok.

---CENA IV: Naquele Canto do Começo

ENTRAM HAMLET, HORÁCIO E MARCELÃO

Hamlet: Tá frio pra cacete. Que horas são?

Horácio: Quase meia-noite.

Hamlet: Não, já passa de meia-noite.

Horácio: Ah, é? E se você sabia, seu merda, por que perguntou? Bom, daqui a pouco chega o fantasma.

TROMPETES TOCAM

Horácio: Que merda é essa?

Hamlet: Frescura do Cláudio. Ele gosta que toquem trompete enquanto ele mata shots de tequila.

Horácio: E é um costume?

Hamlet: Só se for um costume de bêbados, como as nações vizinhas devem pensar.

Horácio: Ê, o fantasma!

ENTRA FANTASMA

Hamlet: Ê, pai morto. O que é que você quer?

Horácio: Parece que ele quer falar contigo sozinho.

Marcelão: Vai não.

Horácio: É, vai não.

Hamlet: Eu vou lá.

Horácio: Caralho, Hamlet!

Hamlet: Do que é que eu devia ter medo? Minha vida não vale nada. E minha alma, se eu tiver, é imortal, não é?

Horácio: E se ele te possuir, te amedrontar e te aterrorizar até o ponto da loucura? Até você ser só uma casca de homem, um doido sem valor, uma desgraça vergonhosa para todos os que te conhecem e até para você mesmo? Ele pode arruinar sua vida.

Hamlet: É, tem isso. Mas eu vou, Tô curioso.

Marcelão: Tu vai o caralho.

Hamlet: Tira a mão!

Horácio: Você não vai, não.

Hamlet: Tira essa porra dessa mão! Sai fora! Me solta e me deixa ir sozinho!

SAEM HAMLET E FANTASMA

Horácio: Ele é doido.

Marcelão: Vamos atrás?

Horácio: Por quê?

Marcelão: Tem algo de podre no reino da Dinamarca.

Horácio: Que sera, sera.

Marcelão. Não, bora atrás dele.

---Cena V: Outro Lugar Desse Mesmo Lugar

Hamlet: Tá, cansei. Abre o bico.

Fantasma: Então ouve.

Hamlet: Tô ouvindo, anda.

Fantasma: Eu logo vou sumir.

Hamlet: Tadinho.

Fantasma: Cala a boca e me escuta.

Hamlet: Já falei que tô ouvindo.

Fantasma: Ótimo. Ouve e me vinga.

Hamlet: Hein?

Fantasma: Eu sou o espírito do seu pai. Me assassinaram.

Hamlet: Assassinaram!

Fantasma: É. Foda, né? Teu tio que me matou.

Hamlet: Meu tio!

Fantasma: Pára de repetir, cacete. É, teu tio. Que ainda por cima tá comendo minha mulher. Por cima, por baixo, de várias formas. Porra. E ainda por cima o cara é feio de dar dó. Não sei como ele seduziu minha gracinha inocente.

Hamlet: ...

Fantasma: Bom, é sua função acabar com essa palhaçada. Mata seu tio, deixa sua mãe viva, ok?

FANTASMA SAI

Hamlet: Hum... vamos ver como eu vou lidar com o cretino e com a puta, então.

Marcelão e Horácio: (sussurrando) Ixe!

Hamlet. Beleza. É isso aí.

Horácio: Opa. Oi, Hamlet. Você por aqui?

Hamlet: Ah, Horácio. Tudo certo?

ENTRAM HORÁCIO E MARCELÃO

Marcelão: E aí, como foi?

Hamlet: Legal.

Horácio. Ótimo. Conta aí.

Hamlet: Não posso. É se-gre-do!

Horácio: Não conto pra ninguém.

Marcelâo: Nem eu.

Hamlet: Hum... tá bom. Tem um filho da puta na Dinamarca.

Horácio: Dã. E daí?

Hamlet: Bom... aí é da minha conta. Ei, não contem pra ninguém o que aconteceu aqui hoje, hein?

Horácio e Marcelão: Não contaremos.

Hamlet: Juram?

Fantasma: Jurem!

Hamlet: Nunca vão falar disso. Juram?

Fantasma: Jurem!

Hamlet: Sério, não pode!

Fantasma: Jurem!

Horácio: Isso é meio esquisito, mas eu juro.

Hamlet: Cala a boca, fantasma! Cacete! Tá atrapalhando!

ELES JURAM

Hamlet: Então tá feito. Ai, ai, como eu sou um fodido. Vou ter que consertar uma baita cagada, viu? Bom, nós três vamos ter que consertar, agora. Se foderam.

2 comentários:

Giácomo Corleone disse...

Puta que pariu! Ficou do caralho!!! clap, clap, clap, clap, clap!!!

Bakunin, o mochileiro comilão de Browniânia disse...

Ok, aqui você manteve sua qualidade de outrora.